terça-feira, 2 de junho de 2015

Do plano imaginário e outros delírios

Ela sentou no meio do campus e esperou que a vida fizesse sua parte. Não era um grande papel, convenhamos, apenas uma oportunidade - que era vital.
Como proceder quando se deseja entregar a alma nas mãos de alguém, chamar seu nome sabendo que ele não tem a real consciência de sua existência? Lançar-lhe aquele olhar intenso ao sorrir e esperar que ele se interesse? Descobrir seus horários e o seguir em todos os lugares esperando  receber um resultado satisfatório e não uma ordem de restrição? Nenhuma resposta que encontrava para essas perguntas a deixava tranquila, todas pareciam difíceis demais. Ela queria, sinceramente, muito mais que um papel coadjuvante para a vida, torcia secretamente que esta atuasse no papel principal.
E enquanto torcia, rezava e esperava pacientemente, sentindo frio na barriga a cada barulho distante, sua imaginação se responsabilizava por todos os gestos dele, o sorriso largo e sereno quando encontrasse o olhar tímido dela, os passos lentos e certeiros que ele daria ao aproximar-se dela, como se ela fosse um solo frágil - e era. Seguraria as mãos dela, que levantaria prontamente. Então ele  a olharia com carinho, seguraria seu rosto com as duas mãos e acariciaria sua maçã do rosto esquerda com o polegar direto. E beijaria sua boca com lábios quentes e úmidos e macios, vagarosa e delicadamente no início, então ambos estariam em chamas e o beijo assumiria um tom mais sublime.
A visão foi tão real que ela sentiu cada toque em seu corpo.
Abaixou-se e arrancou uma flor amarela, do tipo mais comum possível. Sem cheiro. Delicada. Apagada. Alguém como aquela flor certamente teria uma história como essa. Mas ela não era apagada, tinha cor - sangue. E se sabia tão delicada quanto um estilete, ora sangrando a si mesma, ora sangrando o outro. Então se recordou de Caio em A dama da noite. Aquela sim poderia ser a história dela, mas não essa... pronta para qualquer protagonista de romance adolescente que possui um vazio em tudo.
Sem chapéu molhado e capa de gabardine, ele passaria ao lado do banco, lembraria dela de alguma aula em comum. Sentaria e conversaria despretensiosamente, afinal quereria apenas matar tempo. Ele perceberia a compatibilidade entre eles. Notaria nela uma intensidade que lhe traria satisfação, perceberia também uma vitalidade e uma veracidade, jamais haveria percebido isso em outra pessoa. Se tornaria ainda mais curioso.
Ela apenas confirmaria o que previa. Convidaria ele para um bar. Eles iriam.
A conversa se tornaria ainda mais interessante, coisa que me entediaria - o imaginário me convém. Inevitavelmente seus lábios  se encontrariam em íntima vibração de desejo, ao som de Jigsaw falling into place. "I never really got there. I just pretend that I had".
Em cinco minutos estariam certos de que tudo é permitido - como sempre será, e concordariam em ir para a casa dela. Mal a porta se fecharia em suas costas e ambos estariam semi-nus frente a frente. Seus corpos ferveriam mas não poderiam sublimar sozinhos, e o desejo em seus olhos queimaria feito brasa. Se tocariam desesperadamente. Cairiam na cama e não sobraria muito tempo para preliminares. Seriam apenas alguns toques, língua e lábios. O desejo seria tão contundente que consumar o ato seria inadiável. Ela empurraria ela na cama e rapidamente estaria sobre ele. Ele ficaria desconsertado com essa iniciativa, mais isso apenas aumentaria seu desejo. Ela não pensaria sequer uma vez antes de introduzir o pênis dele em sua vagina, e iniciaria os movimentos lentamente, num vai-e-vem quase delicado, mas o tesão se apossaria dela de tal maneira que seria impossível ter calma,e seus movimentos se tornariam cada vez mais rápidos e mais intensos. E eles tornariam a ser mais lentos, apenas para que o sexo se prolongasse. Seria um desejo dividido entre o a ânsia de ganhar o prêmio e a necessidade de que a deliciosa expectativa se prolongasse tanto quanto possível.
Ele estaria curtindo tanto quanto ela, mas sentiria a necessidade de estar no comando, porque aprendera que todo homem tem esse dever. Seguraria sua cintura firmemente, sem machucar, e com o tesão como fonte de impulso a deitaria na cama enquanto rolaria para assumir sua posição. Seus movimentos também alternariam entre rápidos e lentos, pelos mesmos motivos. Quereria cada vez mais se apossar de cada cm² do corpo dela, enquanto suas mãos percorreriam por toda a extensão daquele corpo e sua língua sentiria quão febril aquele ser se encontraria.
E a cada momento trocariam de posição, com o desejo oscilando entre gozar e estar ali para sempre. Mas saberiam que o para sempre jamais existiu, e alcançariam o ápice do prazer enquanto ela estava de quatro e ele teria aquela maravilhosa visão de sua bunda.
Cairiam exaustos lado a lado, com a sensação de que viver valeu a pena simplesmente pela existência desse momento.
Então eu a vi realmente, fora do plano imaginário. Eu a vi em toda a sua verdade. Ela estava deitada em seu pequeno apartamento, convulsionando em sua cama enquanto seguia lentamente para o coma. Ao seu lado haviam apenas cartelas vazias e um lençol velho banhado em lágrimas.

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